Abelissauro é o t-rex brasileiro. Às vezes, autistanto!

domingo, 28 de julho de 2013

El baño del Papa

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#JMJ com a presença do ilustríssimo star: o Papa, que além de pop é santo! E na sua visita ao Brasil quem não o deixou papar mosca foi a mídia. Convehamos, não seria muito diferente se quando ele foi à sacada, no Vaticano, quem o viu primeiro foi a televisão! ''Na tela da TV no meio desse povo'', assim disse o Santo Padre. Jovens nãos sejam manipulados!

Bem, marcada para acontecer junto ao acampamento mor da Jornada, a #MarchaDasVadias também rolou em Copacabana. Do lado profano, ou laico, o ritmo foi frenético e entre os bafos: alguém enfiou uma cruz no cu. Repercutiu!

Oras que gostaria de fazer algumas observações, afinal como nos disse o pregador: "ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura". (Marcos 16:15)


  • Primeiro, meu cu é laico! 
  • A toda ação há sempre uma reação, oposta e de igual intensidade. Depois, realizada a operação de soma zero o que resta é o silêncio.
  • Também acho sem noção mexer  com objetos de cultos religiosos, diriam os despachos! 
  • Se a cruz e a espada andaram juntas, o cu não deixa de ser outra arma.
  • De mais a mais, achei muito positivo ter turistas na Baixada Fluminense, principalmente os hermanos de nuestra Sudamerica, que até me pareceram mais irmãos! 
  • No fim, já pagamos por tanto luxo e desperdício que de qualquer maneira torna-se um prazer pagar por uma cidade no ócio. Um salve às pernas de fora! 
  • Por último, que venha uma próxima #JMJ, só que dessa vez: no pré-carnaval! 
Prepara, que agora é hora..

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quarta-feira, 24 de julho de 2013

Guerra de todos, contra todos. Não é game!

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Para o filósofo Renato Janine Ribeiro uma leitura mais atenta da obra de Hobbes nos adiantaria que o estado de guerra de todos contra todos não seria a regra da pré-história da humanidade; para ele uma leitura mais completa do autor inglês nos revela que "en realidad, existen pactos que valen aún cuando no hay un poder estatal". Portanto, o estado de guerra de todos contra todos só poderia acontecer no advento um poder soberano, haja vista ser esse o cenário mais adequado à disputa dos interesses ao contrário do lugar do 'estado de natureza', em que as disputas provavelmente aconteciam muito mais pelo não cumprimento desses pactos que por um poder real e mensurável.

Segundo o autor brasileiro "una lectura más atenta del conjunto de la obra de Hobbes demuestra que el descontento con el poder legítimo proviene en último análisis de um manejo de las conciencias por um sujeto oculto y opuesto al Estado. En otras palabras, la revuelta no surge tan sólo de la ignorancia o de una desobediencia generalizada. No sucede por casualidad. La ignorancia de los súbditos y la desatención del gobernante solamente resultan incendiarias cuando la chispa es producida por ese escondido sujeto de la política, ese sujeto de patente ilegitimidad: la casta sacerdotal".

Hobbes trata especificamente da casta sacerdotal porque para ele a Igreja estaria comprometida com uma esfera específica da vida humana que o Estado não tem acesso, ou seja, a preocupação transcendente. Logo, no monopólio do uso desse sentido oporia a consciência dos fiéis à sustentação da legalidade e continuidade do poder estatal. Daí que o inferno figure como um território tão importante na capacidade de desafiar a legitimidade do poder instituído e, portanto, com ele realizar a disputa pelo controle do poder, configurando a guerra.

Mas o teórico político escreveu durante o século XVII e seu ponto de vista, hoje, não contempla a complexidade de um estado de guerra geral, ainda que o mesmo conceito seja pertinente. E é pertinente pois nos permite melhor localizar o papel da Igreja Romana nessa disputa na modernidade. Por exemplo, a linha de atuação do novo pontífice, Papa Francisco, na opção pelos pobres, não combate a concentração de riqueza e o enriquecimento exagerado e ilícito, logo não ajudar os pobres torna-se somente mais um artifício alardeante da iminência do inferno, ainda mais que nas sociedades ocidentais a opção religiosa entre os estratos mais ricos é cada vez menor. Em outra via, a disputa pelas consciências através da expectativa do transcendente também é a tônica dos protestantes que no Brasil, mais especificamente, tomam corpo de partidos políticos e bancadas evangélicas. Sujeitos que à maneira religiosa inflamam a guerra como entes escondidos, ou nas sombras.

Como dito, ponto de vista que não contempla a totalidade de hoje, pois tratar dessa disputa no contexto dos Estados contemporâneos é também lembrar o lugar de destaque da economia e das classes sociais que gera. Um exemplo. O vice-presidente boliviano Álvaro García Línera em conferência nos contou um pouco da experiência do país andino. Com a chegada de Evo Morales ao Poder Executivo e a constituinte visando a construção e consolidação de um novo Estado, o que se asseverou no horizonte político do mesmo foi a necessária crise ancorada na insatisfação geral. E por que a insatisfação deflagrou a guerra? A resposta é simples, porque o novo bloco de poder formado por indígenas, campesinos, trabalhadores pobres e trabalhadores da classe média (setores) ao agir na contramão dos interesses imperialistas dependentes demonstrou a incapacidade daquele Estado em cumprir seu papel de agente público equânime e garantidor da soberania nacional. Logo, os setores rentistas (alusão à obra de Lênin, O Imperialismo) e demais exploradores predatórios e dependentes se lançaram à tentativa de golpe no que o político e sociólogo denominou 'embate catastrófico', ou seja, tentaram reconquistar o poder à força num momento de guerra geral. Daí a importância da coesão deste novo bloco de poder, pois assim tiveram a capacidade de rechaçar a tentativa de levante antidemocrático, vide a tentativa de independência da província de Santa Cruz - a mais rica, e prosseguiram na consolidação de um modelo alternativo de poder consumado no Estado Plurinacional. A inflamação alimentada por setores escondidos na política foi devidamente aplacada por aqueles comprometidos com uma outra Bolívia possível, inclusive na disputa pelas consciências.

Mas a guerra de todos contra todos não se restringe a lugares por tratar-se de um estado, como o caso Argentino confirma. Observadas as diferenças, o caso argentino apresenta semelhanças com o caso boliviano confirmando a necessidade de inclusão da economia e das classes sociais na análise. Buenos Aires, por exemplo, é a província mais rica do país, mas não a que mais gera riquezas. Mesmo concentrando parte da atividade industrial, basicamente, trata-se de uma economia rentista - devido o controle sobre os recursos oriundos do escoamento de mercadorias via porto, o que gerou um arranjo de classes também distinto. Lá a classe média é muito maior que a boliviana, mais consolidada e menos distante das classes ricas, ainda que o percentual de pobres no total argentino só tenha crescido até o governo dos Kirchner. Como classe que se desenvolveu na prestação de serviços ao redor das necessidades dos rentistas, tendeu também a concentrar a atenção do Estado e das políticas públicas normatizando um determinado padrão de vida que segue, hoje, sendo universalizado à população, principalmente fora de Buenos Aires e na periferia da mesma. Melhorar as condições de vida dos mais pobres readequando os privilégios dessa classe agora como direitos fundamentais de todos e todas, logo uma readequação do estilo e qualidade de vida geral, deu a essa mesma classe média o lugar de sujeito político oculto inflamador da guerra, pois o que antes era tido como uma recompensa pela sustentação ideológica do constante enriquecimento dos ricos, principalmente durante a Ditadura Civil-Militar e os tempos de Neoliberalismo, agora é encarado pelo Governo como uma necessidade de Estado, ou seja, a redução das desigualdades e o fim dos privilégios. Obviamente esses setores tornam-se descontentes e se lançam à disputa pelos meios que dispõem inflamando a guerra, ainda mais quando o governo da presidenta Cristina logrou alcançar sólida composição no Legislativo que a permitiu, inclusive, dar o start na Reforma do Judiciário, consolidando definitivamente um modelo alternativo de poder. O embate catastrófico que tem a Plaza de Mayo como palco dá o tom da guerra, que além de tudo tem no tango o ápice da expressividade porteña, quem sabe político-porteña.

Como destaque, para García Línera a conquista do Judiciário representa uma etapa avançada nessa conquista que começa pelo Executivo, pois dá conta das necessidades imediatas das pessoas, depois o Legislativo, que assegura a construção de um tipo ideal de Estado e depois o Judiciário, que é mais geracional e onde está a segurança do Estado Democrático de Direito.

E o Brasil? Ah, o Brasil...

Guerra, Portinari
Definitivamente é deflagrado o momento de guerra de todos contra todos. As manifestações de Junho não nos deixam mentir! E também devemos nos ater um pouco mais à economia e às classes sociais para entender nosso momento histórico, que não é exclusivo como visto. Para Maria da Conceição Tavares em "Da substituição de importações ao capitalismo financeiro", a enorme presença de capital estrangeiro em nossa economia tornou-a uma das mais internacionalizadas e abertas do mundo, não encontrando similaridade em nenhuma outra. Na mesma medida, como resultado óbvio dessa estrutura temos uma sociedade dividida em classes profundamente desiguais entre si, configurando ricos radicalmente distantes dos pobres, além de extremamente dependentes em relação à burguesia internacional e financeira, e no meio, a classe média. Como no caso argentino, nossa classe média alcançou sua qualidade de vida como um subproduto da acumulação capitalista dependente promovida pela relação entre os setores da burguesia internacional e da burguesia nacional, representando também um estilo de vida como recompensa para a sustentação ideológica do enriquecimento constante dos ricos, e para tanto concentrou a atenção do Estado e das políticas públicas. Pois bem, em 2003 assume o Poder Executivo nacional o Partido dos Trabalhadores e com isso começa a se delinear um modelo alternativo de poder. Passamos pela crise de 2008, um momento que dificilmente as tensões se elevariam dado o cenário de incertezas, mas concomitante ao modelo anticíclico adotado na economia o que observamos foi a massificação do movimento de ascensão da Classe C. E aí a coisa mudou, pois continuamos aprofundando o modelo de Justiça Social e a redução das desigualdades, enfim, tomou corpo de um fenômeno na vida social brasileira. Até então nunca tinha sido de nossa cultura civilizatória a restituição como política de Estado daquilo que lesamos aos pobres, vide a plena inserção dos negros que estamos lutando desde a nossa libertação, e pela primeira vez caminhamos na direção de um país de todas e todas e com o compromisso de erradicar a pobreza. Assim, as tensões se acumularam e os grupos rentistas já não estão contentes, por exemplo, a primeira correção feita pelo Banco Central no ano de 1999 da taxa Selic foi de a elevação da taxa anual de 29,21% para 37,34%, mas não foi a maior de todas! Hoje a mesma taxa é de 7,90% ao ano. Mas a galera que depende dessas taxas de juros, pois pobre convive com taxas muito mais altas, tem outros meios de disputar o poder, seja através do controle sobre a produção e do crédito, da incorporação de desonerações aos lucros, praticando taxas médias de lucros acima da maior parte das economias no mundo, usando de artifícios para pressionar a inflação e o dólar ou manipulando a opinião pública através da mídia corporativa, falando mais claro, disputando consciências pela (des)informação. Já a classe média é outra história, pois como na Argentina, ela perdeu o lugar de domínio da atenção do Estado e das políticas públicas, além de uma readequação de estilo de vida com a aproximação da Classe C, o que provavelmente deve ser o mais doloroso, pois aí reside o declínio da ideia de exclusividade, princípio fundamental para que a mesma classe média servisse aos interesses de reprodução ideológica do capitalismo dependente como alerta Chico de Oliveira em "Crítica à Razão Dualista". Pronto, está deflagrado o estado de guerra de todos contra todos, pois em uma fatia as classes abastadas já demonstram o total descontentamento com o processo de menos enriquecer, em outra as classes sacerdotais, para ser fiel aos termos de Hobbes, tentam usurpar o poder do Estado desvirtuando sua laicidade, em outra a Classe C quer mais (como é de direito, afinal país rico é país sem pobreza) e na fatia derradeira a classe média que decide concentrar seu arsenal naqueles que sustentaram ideologicamente. No Rio de Janeiro, são os inocentes do Leblom e o os neoliberais da Fifa a mira preferencial. Movimento que não deixa dúvida a opção feita, pois coloca Democracia em risco mais uma vez ao deflagrar uma possível ascensão da direita e asseverando um 'embate catastrófico' que muito mais tende a alimentar em força a Casa Grande que a Senzala, pois definitivamente a classe média tende a dar as costas aos pobres por enxergar neles o fim da política de privilégios. Sem dúvida a apatia em defender também nas ruas a mais que urgente Reforma Política é o sinal claro de que essa classe, assim como os ricos traidores, não desejam a participação dos pobres. No estado de guerra de todos contra todos, numa ilusão de ótica, o inflamação se faz para importunar os de cima para repreender os da base!

Daí que numa clara disputa pelas consciências, no estado de guerra de todos contra todos, o sujeito escondido da política, esse sujeito, que ao contrário das palavras de Hobbes, patente de legitimidade deve permanecer no lugar da defesa incontestável, enquanto progressista, da instauração de um modelo alternativo de poder e não restaurador de privilégios. Daí que é preciso sair ao sol da participação cidadã e dar voz ao velho Marx: trabalhadores, uni-vos!

Uma observação, o autor Lênin também adiantou que uma das competências do capitalismo na especialização de tarefas foi descaracterizar as posições médias de comando, ou especializadas, como se fossem lugares ocupados por TRABALHADORES, gerando o que ele denominou por 'proletariado aburguesado', no geral - os lugares da classe média.

E aí, de que lado você samba?

Com informações de: Renato Janine Ribeiro | Maria da Conceição Tavares | João Sicsú | Lênin | Marx | Eduardo Galeano | Atílio Boron | Alvaro García Línera | Chico de Oliveira | Banco Central

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sexta-feira, 19 de julho de 2013

Nos passos do Passinho

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Uma garotada que dança e encanta. Ontem galera que só dançava nos bailes, hoje galera responsável por um estilo de arte, mídia, grupo e ideias. Um dia o que fora o corredor polonês nas quebradas dos anos 90, hoje tornou-se a linha que separa bondes que desafiam uns aos outros: a batalha do passinho. No geral, clima de festa e competição bem-vinda, pois o que era pancada ficou para trás.

Quase domínio masculino, o processo de troca de informações e extensão dos bailes nas redes sociais fazem com que o quadro mude rapidamente agregando a presença feminina nas rodas informais e competições reais. De modo semelhante, mudanças qualitativas como esta não são observadas com a mesma velocidades nos estratos médios, por exemplo.

Os gays então! Acompanhando a produção do filme 'Favela Gay' da mesma linha '5x Favela' uma observação importante é que na ausência de serviços especializados em segmentos de público, como é comum na classe média em diante - leia-se boate gay, boate hetero, boate deus nos acuda - o pessoal dos subúrbios, favelas e arrabaldes tendem a ter espaços comuns de convivência e diversão, logo numa certa 'convivência forçada' os grupos tornam-se mesclados e a participação dos LGBTs nos bondes deixa de ser uma novidade.

Como dizem por aí: quando não temos nada para compartilhar de material o que resta é o afeto. Imaginemos tal máxima aplicada a jovens pobres! A amizade entre os grupos agrega normalmente muita gente e o conteúdo homoerótico delas é mais esclarecido, afinal de contas, o que há a perder? Num baile, por exemplo, lembro muito mais das ideias de um sexólogo como Kinsey, ou da meinha de todos, que de uma orientação hermética em sentido A ou B. Vejamos, não se trata da negação da orientação sexual, mas não como uma afirmação de cunho biológico.

Obviamente o preconceito existe e uma não profunda etnografia nas redes sociais dá conta de revelar as fraturas e dilemas, mas alguns bondes têm assumido posição de maior destaque entre os bailarinos, alguns deles já tendo até dançado em outros estados e no exterior, e esses também vêm assumindo o lugar da referência. Taxam o preconceito como inútil e dão grandes mostras de fraternidade, respeitando a orientação de cada um.

Quando o assunto é mídia o passinho recheia o mundo digital com memes, videoclipes, vídeos experimentais, aulas em vídeo, ou seja, uma troca incessante de informações e conteúdos diversos. Não há copyright e o direito a que todos dancem e se aprimorem está garantido na liberdade do compartilhamento. Mesmo que Michael Jackson, Caboclo de Lança, Maracatu, Mangue beat, Train Soul e o charme não constem nos créditos e haja ainda muito a impressão do self-made, a tendência aponta para a significação pela coletividade e para a coletividade.

No campo estético também ousam e vão além do tradicional masculino x feminino. Meninos são vaidosos e gostam de brilho e novos adereços. E os cabelos, ah os cabelos, verdadeiros Carmens Miranda! Basta passar por um orkontro em Madureira para notar. Já as meninas são ainda uma incógnita, pois o repertório possível sempre foi maior e parecem não absorver o guarda-roupa masculino como uma iniciativa à la Yves Saint-Laurent com seu 'le smoking', mas de pronto estão ou continuam na contramão das evangélicas que aparentam cada dia mais terem parado nos 9 anos!

E não se assuste se um coleguinha 'Tyco Dancing Perfect Bonde CBT Mister Maridão' tiver 3000 amigos no Facebook! É assim mesmo, afinal os populares somos muitos no Brasil! Assim, constituem também uma rede poderosa de formação de opinião, que, contudo, está devidamente limitada pelo pequeno repertório cultural demonstrado pela maioria, reflexo da educação formal capenga. Nesse sentido, a linguagem não nos deixa mentir. Mesmo acreditando numa língua viva e moldável, no geral o notado é a baixa capacidade de instrumentalização dela por seu escasso domínio. E essa é uma mensagem que os grupos em destaque ainda não absorveram: o valor do estímulo à educação e à participação cidadã!

Observação que de modo algum deprecia a imagem e arte da galera envolvida no passinho, ainda mais que estamos apenas no início de uma longa caminhada que poderia ser chamada de visibilidade dos pobres e por hora fica minha gratidão pelo muito que aprendo desde que venho acompanhando o passinho e sua galera há mais ou menos um ano. Nomes como Cebolinha, JJ, Camila, Bolinho e tantos outros ficam como o registro dos informantes informais, grandes pessoas e que merecem o aplauso geral pela incrível renovação proposta no funk do Rio de Janeiro.

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quarta-feira, 3 de julho de 2013

Proposta de Lei Complementar 130/12

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No Livro I de "Ética a Nicômacos" Aristóteles escreveu: "toda arte e toda indagação, assim como toda ação e todo propósito, visam a algum bem; por isto foi dito acertadamente que o bem é aquilo a que todas as coisas visam". Pois bem, se tomamos a Constituição de 1988, a chamada Constituição Cidadã, como texto que, de alguma maneira, reflete o enunciado como arte, indagação, ação e propósito, necessariamente ela visa a algum bem. Basta, agora, refletir sobre, ou enumerar, que bem! Mas não nos assustemos pois trata-se de uma questão muito simples: o bem, neste caso, trata-se da superação da pobreza inscrita no atraso econômico-social brasileiro.

Falando de outra maneira, para além de assegurar o estabelecimento de um Estado Democrático de Direito, nossa Constituição só poderia ser dita Cidadã se a partir do reconhecimento das peculiaridades do desenvolvimento brasileiro se comprometesse com a referida superação, visto que não haja cidadania plena no contexto de desigualdades.

Para Florestan Fernandes em "A Revolução Burguesa no Brasil" [Formação da Ordem Social Competitiva], nos países subdesenvolvidos industrializados da América Latina "as estruturas econômicas, sociais e políticas, herdadas do mundo colonial, interferiram nos dinamismos do mercado mundial, tolhendo ou selecionando os seus efeitos positivos e restringindo o seu impacto construtivo sobre o crescimento econômico interno. A rigor, tais estruturas produziram um resultado útil apenas porque preencheram - onde tal coisa chegou a ocorrer numa escala eficaz - a função histórica de preservar o controle político de decisões econômicas vitais em mãos nacionais". E, para além da subserviência das elites econômicas e políticas, o autor também afirma: "sob esse aspecto, nem sempre as dificuldades à expansão interna do capitalismo procederam da 'resistência à mudança' por parte dos estamentos senhoriais. É a própria situação  'periférica' e 'marginal' das economias capitalistas dependentes de origem colonial que explica tal fenômeno, com seus reflexos estruturais e dinâmicos sobre a ordem social competitiva correspondente".

Sejamos claros, estamos tratando de desenvolvimento capitalista com justiça social. Daí que o desenvolvimento brasileiro no lugar de diminuir a distância entre ricos e pobres como o acontecido nos países desenvolvidos, logrou apenas aprofundar tais diferenças na expansão desse mesmo capitalismo. Estruturalmente o padrão é o de restringir o impacto construtivo sobre o crescimento econômico interno! À exceção dos últimos 10 anos, nunca foi comum na história brasileira alcançarmos algo como um desenvolvimento qualitativo, ou seja aquele também responsável pela distribuição de riquezas; basta observarmos o período do 'Milagre Econômico' em que as taxas de crescimento em torno de 10% ao ano estavam condicionadas à reconcentração de renda no país, ou somente crescimento quantitativo.

O bolo cresceu, mas não foi dividido! Afinal, nem era do interesse das classes que sustentaram o golpe civil-militar.

Assim, para Chico de Oliveira em "A Economia Brasileira: Crítica à Razão Dualista" [O desenvolvimento brasileiro pós-anos 30 e o processo de acumulação], o que se verifica, por exemplo, é que "a industrialização sempre se dá visando, em primeiro lugar, atender às necessidades da acumulação, e não às do consumo". Pois, "pouco importa, para a 'rationale' da acumulação, que os preços nacionais sejam mais altos que os dos produtos importados: ou melhor, é preciso exatamente que os preços nacionais sejam mais altos, pois ainda quando eles se transmitam interindustrialmente a outras produções e exatamente por isso elevem também a média dos preços dos demais ramos chamados 'dinâmicos', do ponto de vista da acumulação essa produção pode realizar-se porque a redefinição das relações trabalho-capital deu lugar à concentração de renda que torna consumíveis os produtos e por sua vez reforça a acumulação, dado que a alta produtividade dos novos ramos em comparação com o crescimento dos salários dá um 'salto de qualidade', reforçando a tendência à concentração de renda".

No entanto, mesmo numa tendência de distribuição de riquezas como a verificada nos últimos 10 anos, os gargalos do desenvolvimento permanecem, pois o consumo de produtos continua garantido à medida que as classes favorecidas tradicionalmente seguem consumindo e o crédito garante o mesmo para a Classe C. Se a produção atendesse às necessidades de consumo e não as de acumulação - chegamos agora a mais um dos componentes estruturais do atraso brasileiro - mais de 47% da carga tributária hoje recolhida não viria deste consumo, segundo dados da Receita Federal. Ou seja, o Sistema Tributário brasileiro é outro desses componentes ao apresentar-se de maneira regressivo.

Conforma pesquisas do professor João Sicsú, economista da UFRJ, nosso sistema tributário é injusto e regressivo. Mas o que isto significa? Quer dizer que o governo, através do gasto público procura reduzir as desigualdades, mas, a tributação dificulta essa iniciativa.

Mais uma vez, registra-se que da carga tributária recolhida hoje, 47% dela advêm do 'consumo', menos de 5% advêm de 'transações financeiras' e da 'propriedade' e 20% da 'renda'. Dessa maneira as classes favorecidas reproduzem o status quo e o Estado segue se financiando no consumo e não no conjunto da economia. Como resultado, o observado é a baixa capacidade de expansão da atividade econômica pois esta é intrinsecamente vinculada à capacidade de consumo das classes sociais. Assim, os dados demonstram  que um pobre paga tanto quanto um rico quando vai comprar algum bem ou serviço no mercado. Como diz José de Almeida, "esta 'igualdade' faz a diferença, e para o mal. O impacto desse gasto para uma pessoa de baixa renda é muito maior do que para alguém de maior poder, pois este consegue gastar e ainda guardar, defendendo-se, aplicando sua obra em alguma forma de rendimento, que lhe ajuda a recuperar e até ampliar sua riqueza". Aqui, além de frearmos a capacidade de consumo como motor do estímulo à atividade econômica, também acrescentamos outro entrave ao barreirar a capacidade de investimento da Classe C.

Outro exemplo, dentro da OCDE, a carga tributária obtida em países como Estados Unidos, Suíça e Canadá advêm em mais de 50% dos impostos sobre a 'renda' e a 'propriedade'. Nesses mesmos países, o imposto sobre o 'consumo' é que não alcança sequer 20% da arrecadação total. É o Brasil mais uma vez na contramão do desenvolvimento qualitativo, repetindo o diagnóstico de Florestan.

Fato constatado é que o bem, enquanto superação da pobreza inscrita no atraso econômico-social brasileiro tem no sistema tributário outro forte entrave. Sabemos, de outro lado, que reduzir, simplificar e racionalizar a  tributação é muito importante, mas dentro de novos marcos que impulsionem o desenvolvimento qualitativo. Dentro do escopo maior da Reforma Tributária, então, o cumprimento do artigo 173, VII, da Constituição de 88 ocupa o lugar de um compromisso nacional com a realização deste bem.

O Projeto de Lei Complementar 130/12 de autoria do deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP) e co-autoria dos deputados Amauri Teixeira (PT/BA), Assis Carvalho (PT/PI), Cláudio Puty (PT/PA), Jilmar Tatto (PT/SP), José Guimarães (PT/CE), Pedro Eugênio (PT/PE), Pepe Vargas (PT/RS) e Ricardo Berzoini  (PT/SP), visa regulamentar o cumprimento do dispositivo constitucional referido taxando fortunas, ou renda, que estão acima de mais ou menos R$ 14 milhões. O Projeto prevê alíquotas de no máximo 1% e nas previsões somente cerca de 10 mil famílias se enquadrariam no perfil do imposto, ou seja uma imensa minoria, perfazendo cerca de R$ 10 bilhões anuais em arrecadação.

Se o interesse aqui é agregar instrumentos capazes de impulsionar o desenvolvimento qualitativo brasileiro com a superação da pobreza inscrita no atraso econômico-social do país, a proposta que segue é que os recursos do imposto sobre grandes fortunas, sobre a renda, seja obrigatoriamente vinculado ao cumprimento de ações governamentais de estímulo a:

a) individuais, pequenas e médias empresas e cooperativados no ramo da indústria e serviços;
b) pequenos e médios produtores, assentados e cooperativados vinculados ao desenvolvimento agrário;
c) individuais, pequenas e médias iniciativas e cooperativados no turismo de base local e economia criativa;
d) pequenas e médias iniciativas e cooperativados no ramo da reciclagem e do desenvolvimento de tecnologia limpa e informática.

Portanto, o que se pretende ao cumprir a Constituição em seu artigo 173, VII, não é o revanchismo como setores desagregadores da unidade nacional gostam de alardear, mas sim o cumprimento e realização de mais uma iniciativa no sentido de propor uma Reforma Tributária mais profunda que desonere a folha salarial e o consumo, melhorando, com isso, a capacidade de desenvolvimento da atividade econômica como um todo de maneira mais horizontal e diversificadora.

Para finalizar, de acordo com Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faleto em "Dependência e Desenvolvimento da América Latina" [Internacionalização do mercado], "por trás das lutas e aproximações políticas que as condições atuais de enfrentamento entre as classes e grupos incentivam atualmente, continuam presentes as contradições gerais provocadas pelo funcionamento do sistema produtivo baseado nas grandes unidades monopolistas, e as específicas, que derivam das condições particulares de um desenvolvimento capitalista que depende tanto de capitais quanto de técnicas e formas organizatórias geradas nos pólos dominantes do capitalismo internacional". Assim sendo, sem dúvida, a tentativa de superação dessas condições gerais e específicas passa por uma pactuação em nível nacional das diferentes classes que compõem a sociedade brasileira no esforço mais profundo de superação da pobreza inscrita em nosso atraso econômico-social através do desenvolvimento qualificado da economia pela diversificação das atividades. Logo, o chamado imposto sobre grandes fortunas torna-se nada mais que outro passo decisivo nesse esforço, afinal: País Rico É País Sem Pobreza!

Conheça o PLP 130/12 aqui.

Com informações de Florestan Fernandes | Francisco de Oliveira | João Sicsú | Receita Federal | Ipea | José de Almeida Amaral Jr. | pauloteixeira.com.br | Fernando Henrique e Enzo Faleto.

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